LEI MARIA DA PENHA, 14 ANOS DE CONQUISTAS E DESAFIOS A SUPERAR
LEI MARIA DA PENHA, 14 ANOS DE CONQUISTAS E DESAFIOS A SUPERAR
A Lei Maria da Penha é conquista histórica das mulheres e da sociedade brasileira!
Fruto do protagonismo feminino, dos movimentos sociais, das ONGs, por indicação da OEA, bem como do Poder Público, através de um grupo de trabalho interministerial, Coordenado pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, da Presidência da República, foi construído esse instrumento legal – a Lei no 11.340/2006, para fazer frente às violências perpetradas contra as mulheres no ambiente doméstico e familiar até então invisibilizadas/naturalizadas pela sociedade e pelos Sistemas de Justiça e de Segurança.
Um marco legal e um divisor de águas, pois há 14 anos ao afirmar que as violências cometidas em face das mulheres se constituíam em violação dos Direitos Humanos, rompeu com o paradigma de que violência na família, em relações de afeto era de interesse privado e onde imperava a impunidade dos atos violadores de direito praticados na esfera doméstica e familiar.
Ditados populares como: “Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher '' passaram a ser combatidos, pois é responsabilidade da família, da sociedade e dos poderes públicos coibir e prevenir a violência, segundo essa lei sancionada em 2006.
Há que se pontuar que a Lei Maria da Penha não possui somente caráter penal e punitivo; mais do que isso, propõe importante ação intersetorial, no sentido de trazer as medidas de assistência e medidas integradas de prevenção, articuladas entre os diversos setores da sociedade e serviços públicos para que seja eficaz em responder as demandas das mulheres, interrompendo o perverso ciclo de violências a que tantas estão submetidas em suas relações de afeto.
Passaram-se os anos, superadas muitas das resistências iniciais de setores do meio jurídico quanto a sua interpretação e aplicação e o desconhecimento da própria sociedade; no que trata de sua implementação, a Lei no11.340/2006 “pegou”. Pegou porque se tornou conhecida da população, deu visibilidade a essa chaga social e apontou alternativas e possibilidades de enfrentar esse antigo e democrático problema, que atinge a todas as camadas sociais, independentemente de grau cultural, religioso, do tipo físico, ético-racial ou geracional das pessoas envolvidas.
É bem verdade que atinge a todas; no entanto, não transcorre de forma igualitária como se poderia supor. Pesquisas e o Mapa da Violência de 2015 apontam que mulheres negras e da camada social mais vulnerável, são vitimadas em maior número, inclusive pelo feminicídio, em razão do racismo estrutural e do sexismo que se encontram nas estruturas da sociedade. O aprofundamento de estudos da interseccionalidade de raça, gênero e classe nos sistemas de opressão, nos indicam que no enfrentamento às violências de gênero, precisamos considerar essas categorias e especificidades, propondo ações adequadas e eficazes.
Essa questão traz a lume um outro aspecto menos considerado e cobrado pela sociedade, qual seja, de nada adianta realizarmos Campanhas para as Mulheres denunciarem, ou quem quer que seja sabedor de sua ocorrência, se não lhes for garantida uma efetiva e eficiente política pública que acolha e garanta seus direitos fundamentais de assistência e proteção propugnados na lei em comento, em especial nos artigos 8º e 9º.
A Lei Maria da Penha mudou, ainda que não na amplitude desejada, a percepção da sociedade no que diz respeito à rejeição a quaisquer tipos de violência, ajudou a proteger muitas mulheres, que orientadas e apoiadas, se tornaram mais fortes, empoderadas e em condições de exigir o cumprimento de seus direitos e denunciar os agressores. Não obstante, pesquisas e levantamentos preliminares dos órgãos de segurança obtidos nesse momento de crise sanitária e política, apontam índices graves que comprovam o aumento das violências contra vulneráveis, em especial contra as mulheres, razão pela qual os serviços públicos e sociais de atenção a essa problemática precisam se qualificar ainda mais e redobrar seu trabalho, adequando-o ao momento imposto pela crise ora vivida.
A Lei Maria da Penha representou um avanço significativo ao inovar e estabelecer uma política pública que atingiu reconhecimento internacional, pois foi considerada pela ONU como sendo uma das três melhores legislações do mundo no que tange ao enfrentamento da violência doméstica e familiar. Não obstante isso, contraditoriamente, o Brasil figura como o 5o país onde mais se matam mulheres. A ocorrência de um número absurdo e perverso de violências e feminicídios, no Brasil e no nosso Estado, onde só nesse período 51 mulheres foram mortas, segundo a Secretaria de Segurança Pública/RS, em um aumento de 24% em relação ao ano anterior exige uma mudança forte de atitude.
Faz-se necessário ainda que a sociedade em geral e os poderes públicos construam mecanismos concretos, efetivos de forma interseccional que deem ênfase à criação/fortalecimento de redes de acolhimento, apoio, atendimento e estratégias para a superação das barreiras de gênero, raça e classe, e então, garantir à igualdade de acesso, de proteção dos direitos previstas na lei.
De todo modo, temos que comemorar os avanços, ainda que tímidos e insuficientes, no Brasil e, em particular, aqui em Pelotas, onde serviços foram criados e constituídas as Redes de Atendimento e de Enfrentamento à Violência contra as mulheres. Não obstante essas conquistas, entre outras, novos
e antigos desafios temos a enfrentar, especialmente uma mudança profunda na estrutura e cultura da sociedade brasileira precisa ocorrer. Faz-se imprescindível agregar valores de direitos humanos e sensibilizar-se toda a sociedade, além de ampliar-se e efetivar-se mais investimentos no combate às violências, a implementação pelos órgãos e instituições da segurança, da assistência social, da saúde, do judiciário, entre outros, das diretrizes trazidas pela lei, traduzidas em ações efetivas e articuladas na perspectiva de gênero, preventiva e de assistência. Disso trataremos em outro momento.
Hoje, 7 de agosto, quando a Lei Maria da Penha completa 14 anos de vigência, o GAMP, a ABMCJ e a Comissão da Mulher Advogada, da OAB, se somam a outros grupos e instituições no registro de seu papel emblemático pelo fim da violência contra a mulher. Promover e garantir os direitos humanos das mulheres e a construção de uma sociedade com mais equidade e justiça social é atributo de nossas instituições e nosso compromisso.
Não tenhamos medo de sonhar e buscar com mais energia e alegria construir um outro mundo, sem discriminação, sem violência.
Que sejamos, todas e todos instrumento de mobilização em prol dessa causa. Avancemos!
Neusa Couto Ledesma
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS MULHERES DE CARREIRA JURÍDICA COMISSÃO DA MULHER ADVOGADA/ SUBSEÇÃO PELOTAS neusaledesma@hotmail.com
Melina Medeiros Félix
GRUPO AUTÔNOMO DE MULHERES DE PELOTAS,RS gampfeminista@gmail.com
Rua Goncalves Chaves, 659/309 - Tel.: (53) 32257888/99813646 Galeria Antunes Maciel - Centro - Pelotas
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