Fila de espera II

 



                            Fila de espera II

Todo mês, no dia de buscar a medicação
Na farmácia popular, é sempre assim, demora
Tanto, mas tanto, que a gente acaba sendo obrigada
A ouvir tudo que lá se conta, é que além de o lugar ser
Pequeno, ninguém mais faz sigilo, de modo que,
pra bem de se bem ouvir, o povo já acostumou a contar com a
Voz bem colocada.
Nunca esqueci daquelas mulheres, mãe, filha, e neta.
As três sentaram assim: a jovem com a menina de uns 2 anos sentaram ao meu lado,
A mais velha sentou-se na cadeira defronte.
Estavam lá para buscar remédio para a pequenina, não se sabe porque.
O fato é que naquele dia, elas já estavam na rua desde muito mais cedo,
Elas haviam passado primeiro na delegacia para o B.O de violência sexual contra menor.
A moça, mãe da bem pequena, havia sofrido um estupro na última madrugada, e antes que Alguém acuse a moça de estar na rua facilitando o ocorrido, eu já adianto que, a jovem estuprada estava na sua casa, cuidava da filha que dormia, e foi quando seu pai, o seu, não o da pequena, o pai da jovem a encurralou na cozinha enquanto a jovem fazia uma mamadeira, a jovem gritou que o pai estava louco, nisso a mais velha acordou e foi até a cozinha, lá se deparou com o seu velho forçando a menina a fazer sexo oral.
O velho ameaçava com uma faca e dizia:
- se me morder te furo!
A velha desesperada bateu com a panela de pressão na cabeça do tarado, pela ultima vez chamado de marido.
E isso contaram na delegacia, e foi justo na delegacia que a velha ficou sabendo que isso já acontecia a muito tempo e que na verdade ele bem que podia ser o pai que a menina bem pequena não tinha.
A velha desabada na tontura, não sabia mais no que pensar.
E lá na farmácia as duas brigaram porque o tal velho surgiu lá,
E entregou pra jovem um iogurte de litro e umas bolachas que era pra ela não sentir fome, e avisou que em casa ela iria encontrar tanta coisa boa que não valeria a pena ela seguir denunciando porque ela arriscava perder os confortos que ele dava.
As duas discutindo e eu ali com o estômago embrulhado, eu queria fugir daquela dor.
Mas ele estava sentado encostado na porta com a netinha no colo brincando de cavalinho.
Tive nojo, asco, e um medo paralisante.
Dor de barriga e uma facada social .
Agora eu já não sabia mais nada.
O quê era pior?
Ser estuprada pelo pai, ou ser traída dentro de casa diante dos olhos, ou se agora quando
O velho tá ali perto da porta bulindo com sua neta.
O velho se molhou e lambuzou a meia calça da neném, todo mundo fingiu que não viu,
A velha havia enviado uma mensagem pelo celular, e a viatura chegou bem na hora do gozo do velho na meia calça e nas fraudas da neném. Dessa vez será que ele dura um mês trancado? Esse dia foi marcante, dia em que demorou tanto o atendimento, que o homem que tava ao lado do velho, enquanto ele bulia com a neném, dormiu enquanto tudo se passava.


"Histórias Quase Inventadas" 

Autora: JANETE FLORES, 54 anos, natural de Porto Alegre, radicada em Pelotas desde a década de 90, com formação em Artes, habilitação em Música pela Ufpel, compositora, instrumentista, cantora, artista plástica e escritora. Membra associada ao GAMP.

Pelotas, novembro de 2020



Grupo Autônomo de Mulheres de Pelotas - Informa

Sugerimos as seguintes recomendações:

Busque a Unidade de Saúde pública mais próxima e converse com uma Assistente social, médica ou enfermeira.

Você não é culpada!

Violência sexual na adolescência, perfil da vítima e impactos sobre a saúde mental


Anote o número de telefones importantes:

Ministério Público (MP) -  Telefone: 3279-3555 E-mail: pjespecializadapelotas@mprs.mp.br 

Conselho Tutelar (CT) Telefone: 3227-5613 E-mail: ctpelotas@gmail.com 

 Delegacia Policial da Criança e Adolescentes (DPCA) - Telefone: 32254567  -  E-mail: pelotas-dpca@pc.rs.gov.br 


Violência Sexual de criança e adolescentes:

Atos intencionalmente praticados para causar lesões físicas, ou mentais, ou de ambas as naturezas com finalidade de obter determinada vantagem, informação, aplicar castigo, entre outros.

Relação de poder com abuso da autoridade ou da ascendência sobre o outro, de forma inadequada e com excesso ou descaso. Coerção.

Distinção, segregação, prejuízo ou tratamento diferenciado de alguém por causa de características pessoais, raça/etnia, gênero, religião, idade, origem social, entre outras.

Situações de abuso ou de exploração sexual de crianças e adolescentes. Implica a utilização de crianças e adolescentes para fins sexuais, mediada ou não por força ou vantagem financeira.

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